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quarta-feira, 9 de julho de 2008

Éxica no Tinhatro

Grupos teatrais e a produção de diários de montagem





Índice

O porquê do trabalho

Os objetivos do trabalho

Escolha do objeto de pesquisa

O que solicitei e o que me foi entregue

Grupo Galpão

Análise do Relato

Conclusão

Anexo I – Relatos de Macbeth

Anexo II – Email Cia dos Atores

Anexo III – Relato Andreza Bittencourt

Anexo IV – Relatório I (18/06/08)

Anexo V – Preços das publicações

Anexo VI – Trecho dos Diários de Montagem do Galpão


O porquê do trabalho

A matéria de Direção I, ministrada pelo professor Eduardo Vaccari, foi dividida em duas etapas. A primeira de cunho teórico, de análise de textos. A segunda de caráter prático, onde os textos analisados seriam encenados. Éramos dezesseis alunos, pelo espaço e tempo, era complicado que todos nós dirigíssemos uma cena, assim a turma foi dividida em quatro grupos, cada um deles com quatro pessoas: um diretor, dois atores e um relator. Apesar de ter sido encaixada como atriz, a figura do relator foi a que mais me interessou.

A direção podia não ser o nosso “cargo” naquele momento, mas o professor quis que nosso olhar fosse de diretor. Com isso, o papel do relator era quase de um crítico teatral, mas com olhar sobre um processo, não sobre uma peça acabada. Era incentivado ainda que cada ator e diretor tivessem o hábito de produzir um diário contendo as impressões alcançadas nos ensaios. Passei então a relatar cada passo do processo logo depois de cada ensaio.

Para caracterizar melhor o relato produzido por mim vou esmiuçar como era o processo em que estávamos:

O professor Vaccari participou de uma mesma oficina que a aluna Laura Nielsen participou. Essa oficina era oferecida pelo Théâtre du Soleil e ministrada pela diretora do grupo, Ariane Mnouchkine. A pesquisa do grupo era baseada no improviso em cima de um texto pronto, dentre outros detalhes. O professor achou interessante que, tendo os dois participado dessa oficina, Laura ficasse como diretora de um dos grupos e empregasse o método apreendido nas aulas que tiveram. Em princípio, para acompanhar o processo, Vaccari ficaria inclusive como relator do grupo, mas por fim, a aluna Nina Balbi ocupou esse lugar. O texto escolhido foi Macbeth de William Shakespeare (o mesmo usado na ocasião da oficina). Eu ficaria com a personagem da Lady e Júlio Castro o personagem título.

O método utilizado para interpretação foi novo a, praticamente, toda a turma e foi alvo de investigação até dos não envolvidos no processo. Além disso, o professor Vaccari pretende usar o Théâtre du Soleil como objeto de pesquisa de seu doutorado, demonstrando o caráter no mínimo instigante que o método usado trás.

Foi unido, então, a necessidade de escrever um diário de impressões à um processo novo e complexo.

Como a cada novo encontro surgia, em virtude da utilização do método, um lugar novo trabalhado, dificuldades iniciais quebradas, avanços inesperados, a necessidade acadêmica de relatar o processo passou a ser uma obrigação pessoal. Principalmente após constatar que o próprio exercício da escrita me levava a levantar questões que de outra forma ficariam esquecidas ou mal desenvolvidas. Foi assim que produzi além de um diário (Anexo I), outros documentos mais aprofundados de cunho descritivo e reflexivo.

Quando percebi, a produção de textos sobre minhas impressões se tornou um hábito, tanto nesse exercício de Direção I quanto em qualquer outra atividade teatral.

Aliado a descoberta dos diários de processo, meu caminho no teatro sempre esteve ligado à pesquisa e investigação.

No início desse ano, Júlio e eu demos início a uma pesquisa teatral com base na filosofia de Albert Camus e o teatro de Samuel Beckett. Era um trabalho despretensioso no sentido de almejar construir uma peça, entrar em cartaz, etc. Nós iniciávamos uma pesquisa, primeiramente com apenas um ator, para alcançar a construção do corpo e atitudes do “homem absurdo”.

Logo a necessidade de documentação apareceu para que a pesquisa não se perdesse. Passei a relatar cada encontro durante o acontecimento e posteriormente a ele. O meu diário de processo passou então, além de ajudar como documentação dos acontecimentos e levantamento de questões da investigação, a ser um ponto de partida nos processos criativos. Escrever me ajudava a “guardar” movimentos, ”salvar” impressões e a criar novos caminhos de pesquisa, organizar pensamentos que seriam transpostos para o espaço de encontro teatral.

A pesquisa foi se tornando maior que o a proposta inicial, víamos que precisávamos de mais atores e acabamos por nos encaixar na descrição de grupo teatral. Fomos batizados pelo acaso com o nome de “Teatro Porrada ou Triste Espetáculo” (Triste Espetáculo é uma fala que Macbeth diz a Lady e nos marcou desde a nossa experiência em Direção I).

Ao ver a minha necessidade de escrita e querer transportá-la a todos, dei a cada ator um caderno para que as suas impressões fossem registradas. Vejo a riqueza que ter um diário me proporciona e quis assim compartilhar a minha experiência. Acredito, aliás, que por ter esse caráter de pesquisa, a ausência de diários levaria a uma pesquisa incapaz de sobreviver ao momento de acontecimento.

Foi por ter esses antecedentes que resolvi optar por um trabalho final de Ética ligado a relatos produzidos por grupos que promovam a pesquisa teatral.


Os objetivos do trabalho

No início, não sabia exatamente como abordar esse tema associando ao conteúdo da matéria de Ética. Achava que era suficiente falar de grupos teatrais uma vez que esse foi um dos temas apresentados durante o curso.

Ao longo das discussões de desenvolvimento do trabalho ia vendo a fragilidade da minha proposta. Ela parecia não ter porquê de ser apresentada nessa matéria. De início pensei em associar os relatos diretamente a grupos, no sentido de demonstração da sobrevivência destes fora do circuito comercial de teatro. Mas uma vez, eu mesma me questionava qual seria o porquê de falar dos relatos em si, já que nesse tema poderia falar mais objetivamente de editais ou de estrutura de festivais ou de gestão de grupos de fato.

Ao entrar em contato com os Diários de Montagem do grupo Galpão, percebi que eram publicações que poderiam gerar renda e vi que a linha do meu trabalho poderia ser essa: a gestão de grupos através de publicações. Passei a direcionar minha pesquisa nesse sentido para ver se essa linha era possível.

Meus olhos foram abertos quando, no último encontro que tivemos para discussão do trabalho, o conceito de gestão foi ampliado. Enquanto eu observava o lucro imediato através simplesmente da venda das publicações, me foi mostrada a questão do que é agregado ao grupo quando uma publicação (seja como relatos, ou históricos do grupo, ou um livro de fotos) é apresentada juntamente com o currículo. É um lucro muito maior que a venda dos livros, um ganho em longo prazo.


Escolha do objeto de pesquisa

O meu primeiro contato com o grupo Alice 118 foi em 2004, quando eu tinha 16 anos. Nessa ocasião o grupo participava de um projeto patrocinado pelo Banco do Brasil onde oferecia diversas oficinas gratuitas. Entrei em uma das oficinas e me vi participando de um processo que até então eu não conhecia, de intensa pesquisa e experimentação. Logo descobri que o grupo oferecia oficinas no Teatro II do Sesc Tijuca, no Centro de Estudo Artístico Experimental (CEAE) desde 2001. Ainda hoje o meu contato com o grupo é intenso e ainda freqüento as oficinas e com o passar do tempo fui entendendo melhor o que me chamou atenção de princípio no grupo.

O primeiro espetáculo que eu assisti do grupo, Comoção, era algo para mim totalmente novo. Longe das convenções teatrais que estava acostumada, longe da interpretação padrão que eu fui educada a manter. Depois vim a saber que Comoção era fruto de um ano e meio de pesquisas pelos estados emocionais do homem com suas reações aos acasos da vida. E que tudo que o Alice produzia não escapava da experimentação de longos estudos teatrais.

A escolha do Alice 118 para ser o objeto analisado tem duas “explicações”. A primeira por ser dos grupos o mais próximo de mim e que eu mais tenho contato. A segunda é o estudo que eu faço em cima da pesquisa do grupo antes mesmo do trabalho aqui apresentado. Receber relatos de processos do Alice enriquece a minha própria pesquisa no campo da experimentação teatral.


O que solicitei e o que me foi entregue

O meu primeiro contato foi com Andreza Bittencourt, atriz do Alice 118, professora do CEAE e produtora do mais recente espetáculo da Ana Kfouri, Animal do Tempo. Expliquei a ela como seria o trabalho e perguntei se ela ou algum dos atores do grupo tinha o hábito de relatar o processo de montagem, produzindo alguma espécie de reflexão sobre a pesquisa realizada. Ela me respondeu que nem ela nem nenhum dos outros atores fazia uso da escrita para documentar a experimentação, mas se dispôs à produzir um relato para mim. Perguntei se era possível conseguir o clipping do grupo, ela disse que me enviaria por email.

Posteriormente, mandei um email para outros integrantes do Alice a fim de conseguir mais relatos.

O próximo passo foi perguntar (via email) a alguns grupos que eu sabia ter publicações de relato de processo o real lucro obtido com elas e, a quem respondeu, enviei um outro email perguntando sobre o lucro não imediato, o que as publicações trouxeram para o grupo.

Além dessas solicitações, me utilizo na pesquisa dos Diários de Montagem do Grupo Galpão.

Depois do último encontro que tivemos, no dia 26 de junho, resolvi pedir a todos os integrantes do grupo (que eu consegui o email) um relato nos moldes que enviei para Andreza Bittencourt.

Para os atores do grupo que eu conhecia enviei um email mais pessoal, para os outros tratei mais formalmente e enviei o texto que se segue:

“Assunto: Alice 118

Corpo de email:

Sou aluna do Centro de Estudo Artístico Experimental e sou estudante da Direção Teatral da UFRJ e estou fazendo uma pesquisa que serve ao trabalho final da matéria de Ética no teatro, ministrada pela professora Adriana Schneider.

O trabalho é sobre gestão de grupos e companhias teatrais. Eu pretendo enfocar as publicações escritas que os próprios grupos produzem sobre seus estudos e processos de montagem.

Gostaria de saber se você, como ator do Alice, já sentiu a necessidade de relatar os seus processos e se já o fez. Se já, ficaria satisfeita se me cedesse alguns dos escritos para utilizar no meu trabalho. Se não, gostaria de saber se há interesse seu de produzir um pequeno documento sobre o grupo.

Esse relato serviria apenas para análise dentro do trabalho, não sendo usado para nenhum outro fim senão acadêmico. Caso haja interesse, seria bom um relato com caráter bem pessoal, talvez facilite, inclusive, relatar apenas um momento da carreira de vocês no lugar de produzir um apanhado.

Sinto que sou, de certa forma, invasiva e exigente no meu pedido, caso não se sinta à vontade de fazer ou esteja muito ocupado mesmo assim agradeço.

Grata,

Amanda Doria”

Enviei para seis atores do grupo (que não me convém falar os nomes). Apenas duas pessoas me responderam se disponibilizando a fazer o relato e responder as questões. Entrei em contato novamente, expliquei mais um pouco as características do relato e estipulei um prazo (terça agora, dia 1º de julho). No entanto, ambos os relatos não chegaram a tempo. Entendo que pedi em cima da hora e sei que sua produção requer tempo e cuidado, logo não as culpo pela falta.

Andreza se disponibilizou também a fazer outro relato, no entanto, só tenho em mãos o primeiro relato de Andreza, o outro não chegou a tempo.

Emails para grupos:

Enviei um email perguntando sobre a renda gerada pelas publicações para a Cia dos Atores, o Grupo Galpão e o Armazém Companhia de Teatro. Somente a Cia dos Atores me respondeu. Visto isso, e a mudança de estratégia, mandei novo email para eles procurando saber o que as publicações modificaram de fato no grupo e qual a sua necessidade já que ela não gera renda substancial (Anexo II), esse email, infelizmente não foi respondido.

Outra falta encontrada no material de trabalho e a ausência do Clipping, que Andreza não conseguiu a tempo providenciar para mim. Porém, sua falta não chega a ser de fato pesada, visto que minha linha no trabalho havia seguido outros rumos, mas levando em conta a falta de relatos, talvez no clipping eu achasse algo que me conduzisse a outro lugar.


Grupo Galpão:

Gabriel Villela, diretor do Grupo Galpão à época de 1992 e diretor de Romeu e Julieta, sugeriu para essa montagem que Carlos Antônio Leite Brandão, Cacá, o dramaturgista convidado do grupo, que fizesse um Diário de Montagem. Esse hábito passou para outras montagens e para outros autores (o Diário de A Rua da Amargura foi produzido por Eduardo da Luz Moreira, ator e fundador do grupo.). Somente em 2003 os Diários foram disponibilizados e lançados em forma de livro.

Os diários publicados são das montagens: Romeu e Julieta (1992), A Rua da Amargura (1994), Um Molière Imaginário (1996-1997) e Partido (1998-1999) englobando toda a década de 1990.

Em princípio, a prática da escrita não era essencial, era feita conjunta aos ensaios mais com pouca importância, funcionava como um registro mecânico. Porém, logo a necessidade dos escritos foi ficando evidente. Os livros de atas onde eram produzidos os diários se tornaram instrumentos de desenvolvimento de trabalho, para avanço do reflexões, amadurecimento de decisões, proposições de caminhos, etc. Com o tempo, além de servirem somente ao Cacá, autor do documento, serviam também a outras pessoas como uma fonte de pesquisa.

Os livros contêm a descrição de um teatro estranho ao público, um teatro se construindo. A vista é mais invasiva do que a coxia em dia de apresentação. O que nos é apresentado são pessoas, com suas vidas, seus defeitos e qualidades, em um processo de produção de um espetáculo que não se pode mais presenciar. Os diários são os registros mais sinceros e rasgados de um objeto artístico que não existe disponível a todo momento como o teatro. Apesar do Galpão ser um grupo de repertório, o Romeu e Julieta apresentado e 1992 não é e não pode ser o mesmo apresentado hoje. Além do que é óbvio dizer: o espetáculo teatral nunca pode ser o mesmo, a arte da encenação e da interpretação não são artes precisas na execução ao ponto da repetição. O agravante maior para tal são os falecimentos e saídas de elenco do primeiro espetáculo para um apresentado hoje. Os relatos almejam platonicamente tornar perene o que só pode ser eterno no momento de acontecimento.

O que é apresentado ali, juntamente com as estruturas dos espetáculos em construção, são relações de vida, depoimentos pessoais, impressões. O diário também não pode ser tomado como algo que espelha a montagem e os contínuos ensaios porque parte de um ponto de vista somente. Mas, sabiamente, Cacá Brandão sabe a fragilidade que se encontra no papel de observador e em nenhum momento se coloca como privilegiado no lugar de observação, dono de uma vista superior ou coisa que o valha. Ele se questiona várias vezes se a impressão que tem sobre os ensaios são realmente definitivas, principalmente ao ter uma visão não muito agradável (Exemplo no Anexo VI). Isso demonstra que há generosidade no olhar do autor e que, mesmo que tenhamos uma visão parcial, ela não se dá por absoluta e tem consciência de suas limitações.


Análise do relato de Andreza Bittencourt

Sinto que analisar apenas um relato trás profundas dificuldades para o meu trabalho talvez, antes de falar dessas dificuldades eu deva tratar de outra: quando pedi os relatos dos atores do Alice 118, esperava romanticamente encontrar relatos da época que não foram publicados, mas que tiveram a necessidade de existir, contudo, o que me foi possível conseguir foi relatos de memória. Os relatos de memória não contêm o frescor do acontecimento teatral quanto um relato escrito durante ou logo depois do momento estudado. Além dessa dificuldade, soma-se o caráter de “favor” feito a mim para a produção do relato. O ideal seria eu encontrar escritos que emanassem da mais pura necessidade de expressão. Como isso não foi possível, tenho a mão um relato mais eficaz á pesquisa de trajetória histórica do grupo do que, propriamente, à pesquisa das estruturas do fazer teatral.

No primeiro parágrafo do texto da atriz, observo um esforço de descrição quase que classificatório do trabalho do grupo. Uma necessidade de introdução que seria desnecessária a relato de recorte de um momento do grupo. Nos que se seguem, Andreza fala rapidamente de cada espetáculo que o grupo construiu ao longo de sua trajetória. Não se fixa em nenhum em particular, não desenvolve nenhuma impressão. Nesse ponto, o relato ainda não é propriamente um diário, se coloca muito mais com um caráter jornalístico, uma identidade que não chega a me agradar, pois foge aos meus objetivos do trabalho.

Fiquei bastante impressionada nos últimos dois parágrafos, onde já claramente se vê a atriz falando de suas descobertas para os dois espetáculos mais recentes do grupo. Talvez, somente por essa proximidade e vivacidade na memória tenha sido possível uma entrada mais eficaz no universo das montagens. Como ela mesma salientou em uma conversa que tivemos, o relato ficou “longo para o que é e curto para o que se destina.” Ela tem consciência que esse pouco que nos alcançou nos dois últimos parágrafos é insuficiente frente a riqueza que poderia ser extraída em uma discussão mais profunda.

Ao ler o relato, discutimos sobre o que trouxe para ela como atriz sofrer esse tipo de reflexão. Sinto agora o que perdi ao não ter formalizado essas conversas e gravado para melhor desenvolvimento do trabalho. Ela deixou claro o quanto foi dignificante se propor a construção do relato. Além disso, demonstrou a importância de falar das pesquisas do Alice 118 (e qualquer outro grupo teatral) seja através da linguagem escrita seja através da verbal. Relembrou da vez que o grupo participou do projeto do Sesc, Palco Giratório (com Comoção, Eu Sou Mais Nelson e Potlatch, em 2005), onde o hábito de palestras incentivava a verbalização por parte dos atores, logo, a construção e organização de pensamento. Apesar do tempo não ter permitido que o segundo relato de Andreza fosse apresentado, sinto que o embrião da discussão de idéia que tanto enriquece a prática artística está presente.


Conclusão:

Apesar de ter inicialmente em mente somente a renda imediata que a publicação de relatos de grupos pode gerar, ao terminar esse trabalho vejo o que de mais interessante esse tipo de prática pode trazer para grupos e companhias ou qualquer artista que deseja desenvolver uma atividade. Relatar suas práticas artísticas serve para gerar um arquivo, uma memória; engrossa o currículo; discute e produz a arte que é feita; eterniza o acontecimento efêmero da prática teatral; dentre outras vantagens que podemos buscar.

Como diz Cacá Brandão se referindo a Guimarães Rosa em um dos Diários “esquecer é igual a perder dinheiro”. Um dos produtos mais importantes nascido da organização dos relatos é a memória guardada. Contar a história de um grupo através desse tipo de memória é mais produtivo e abrangente que um olhar posterior sobre fatos que um jornalista pode ter, por exemplo. Transformar impressões de momentos de um grupo em um objeto palpável faz com que a memória seja somada ao patrimônio do grupo. Nos tempos em que a figura do assessor de imprensa é tão necessária para que um grupo consiga patrocínio, uma publicação editorial é um modo de enriquecer o currículo do grupo, abrindo portas e permitindo novos acontecimentos.

O teatro é um tipo de arte que não pode ter o “consumo” posterior ao ato de fazer, diferente da literatura que tem o livro, a música que tem o mp3, etc. O teatro é único em seu momento. O relato, apesar de não ter essa pretensão, serve, dentro de suas limitações para alongar momentos curtos. Ao ler uma descrição das estruturas que permitiram uma peça acontecer, com a ajuda da imaginação, recriar um momento é possível, e necessário muitas vezes. Da mesma forma que, no momento em que escreve o que vê o relator pode suscitar idéias e, portanto gerá-las, o leitor pode apreender as idéias geradas e executá-las. Nunca seria possível recriar o momento teatral, mas seria uma forma de notação, a exemplo da dramaturgia convencioal, para obtenção do espetáculo.
Anexo I – Relatos de Ensaio Direção I

Cena de Macbeth de William Shakespeare

Direção Laura Nielsen

Orientação Eduardo Vaccari

Impressões de Ensaio - Ensaio 1 - 31/10/2007

Não tive, e nem me esforcei pra ter, tempo pra reler Macbeth. Reli bem porcamente a minha cena. Sinto mal esse texto desde a primeira leitura na aula, das análises de personagens que fizemos. Mas não sei o que esperar.

Da minha parte houve um desconforto empático com relação à posição da diretora. O que eu diria? Quero que acabe logo. Parece uma situação forçada.

Sempre odiei ser a primeira a entrar em cena. Dessa vez sou a primeira a falar numa leitura dorida. A gente mais gagueja que fala. Lemos, conversamos e depois fugimos. Não sei como a Laura se sentiu, mas eu me sentiria bem desconfortável no seu lugar.

Quando acabou foi um alívio, mas estou instigada, e antes ansiosa, para saber que tal processo mágico de improvisação é esse. Tensão.

Impressões de Ensaio - Ensaio 2 - 06/11/2007

A primeira coisa que senti quando olhei pra Laura, antes mesmo de começar, foi que a atitude dela mudou. Me deu meu texto digitado. A sinto mais segura. Acho até que acredito mais nela.

Estou quarenta vezes mais curiosa do que no primeiro ensaio.

Trouxe a saia que a Laura pediu. Uma bota. Faz parte do processo. Não queria vestir a saia porque o Júlio não trouxe nada. Vesti. Laura apagou a luz, me senti melhor.

Nunca tinha feito ensaio com tanta gente olhando, principalmente ensaio tão específico. Nervosa estou. Que o medo não me domine.

Explicado o exercício fui tentar. Júlio também está nervoso. Mas quem não está? A "platéia" parece estar nervosa por mim.

Primeira entrada: ansiosa. Segunda entrada: nervosa. Na terceira acho que as correções já passavam por outros caminhos que não o nervosismo. Acho que conseguir dominar o medo. Ah, queria até que durasse mais tempo. Acabou.

Me sinto nova. O novo processo é uma permissão. Me sinto muito bem. Agora espero mais coisas, mais calma. Respeito os pontos da Laura.

Impressões de Ensaio - Ensaio 3 - 07/11/2007

Começa. Começou com a porcaria da minha entrada. Laura e Nina atentas. Não queria olhar pra elas porque tinha (e tenho) a impressão que estou, antes de fazer a Lady, procurando uma reação às minhas ações. Olhei pouco. Ao mesmo tempo não cabia outro lugar pra olhar. Então ficava procurando as duas.

O Júlio está bem concentrado, gosto disso, me dá segurança.

Primeira parada. Laura falou pra eu olhar mais pra platéia. Encarar em vez de paqueirar. Passei a olhar.

Ela disse pra eu não andar muito. Só com motivo. Com certeza teria dito a mesma coisa se eu estivesse me dirigindo. Deve ser o nervosismo insistente. Tentei não andar, mas tinha o medo de parecer fincada no chão. Ela tornou a falar: “base”. Parei na base. Realmente é impossível eu me ver estando do lado de dentro.

A cena continua. Júlio entra. Estamos nos entregando. Trazer as tesouras representando os punhais foi ótimo. Depois a sujeira foi ótima.

A Laura fala, a gente não se mantém. Teve uma vez que a gente se manteve. Tem a ver com o tom de voz que ela usa. Acho que ela vai perceber isso.

Nina saiu da sala. Voltou na exata hora em que eu estava entrando. Acho que não usei bem isso.

Esperei durante muito tempo até entrar depois da minha saída. Várias vezes o Júlio repetiu o mesmo texto. Foi bom pra sentir do lado de fora as minha mãos. Elas estão sujas como as do Júlio. Ah, agora estou racicionando demais aqui esperando. Quero entrar! Vambora, Júlio!

Entrei. Saber que tá pra acabar me dá tranquilidade. Laura elogiou coisas que não sei quais são, tudo muito vago. Falei pra ela falar na hora da próxima vez.

Impressões de Ensaio - Ensaio 4 - 13/11/2007

Repetição? Quem gosta de repetição?

Corridinha em volta do pátio interno. Davi está ensaiando suas atrizes no caminho que leva até o quarto do rei. Vai estragar tudo. O pio da coruja será a aguda Laíse. Empurrar a parede. Entrei em cena realmente cansada, ofegante. Não Laura, eu não estou forçando a respiração, pero así es se así te parece. Mas concordo que entrei mal. Dispersa. Fui elogiada demais. Me sinto qualquer péssima coisa. Pior ensaio.

Júlio!! Estamos os dois distraídos. Dependo intensamente de ser dirigida. Não sei o que estou fazendo. Pausas que não tiveram nos outros ensaios. Estamos distraídos, rindo de qualquer coisa.

Use mais o espaço. Estava entendendo o espaço como arena. Pedi pra Nina sentar do outro lado, daí seria obrigada a olhar pro outro extremo da sala. Laura explicou o espaço. Tenho enorme espaço vazio pra usar sozinha nesse monólogo medieval (grunido).

Esse ensaio não está rendendo. E eis de repente entra Diogo e fica procurando por qualquer coisa. Eu espero. Ele demora. Esse ensaio tá uma merda e a gente não vai sair daqui.

Numa das paradas Laura disse mil coisas. Não vou lembrar de nada na cena. Ela espera um momento de parada natural pra falar. Em nenhum momento parou por si só, interrompeu.

Na nossa primeira passagem mal consegui tocar no Júlio. Me forcei na segunda a fazer isso, sem qualquer pretensão de ficar cênico. Era imprescindível. Larguei meu texto. Se tiver que ficar com o texto do Júlio terei a obrigação de estar perto dele. Agora a gente vai se engolir.
Laura disse que estou pecando com o texto, concordo. Hoje não é o meu dia. Quero novidades.

Impressões de Ensaio - Ensaio 5 - 13/11/2007

Não tinha sala, fomos ensaiar no campinho, já não estava me sentindo bem, agora essa.

Nina fez o aquecimento que ela tanto precisava. Espero que tenha surtido algum efeito físico. Eu queria sentir alguma diferença. Tô meio morta, acho que quero é dormir.

Coloquei a saia e percebi que tinha esquecido o texto (grunidos múltiplos). Ia já tirando a saia quando sugeri da gente usar um único texto. O que me obrigaria a contracenar. “Tudo bem, a gente pode experimentar.” Devia contar quantas vezes Laura fala isso.

Estou inibida até pra correr. Isso parece o primeiro ensaio. Três vezes a entrada até sentir alguma coisa. Quero gritar pra todos da quadra, mas minha platéia não é o João Caetano. Uh, na terceira vez acho que comecei a criar. E o Júlio está fora, espera.

O monstro da repetição voltou. Vaccari veio assistir. Laura elogiou qualquer coisa, merda, agora vai dar errado. De volta ao primeiro ensaio. Será que o Júlio já contracenou comigo ou ele sempre esteve atuando com a minha insegurança?

O Vaccari capotou. Falam demais. O Júlio achou algo bom, movimento que vem dos ruídos. Devolve um pouco da vida que a gente tem quando entra e se perde. Deve ser horrível ver defunto atuando. Não sei o que fazer.

Mais blablabla. No fim, Júlio não consegue mais achar o personagem. Vai pro canto procurar. Laura encerra o ensaio.

Laura admitiu que tem certo receio de interromper a cena pra indicar qualquer coisa.

Nina não entrou. Talvez resolva muita coisa quando ela entrar.

Próximo ensaio vou tomar guaraná em pó antes. Preciso esquecer o natural. Quero raspar a cabeça também.

Impressões de Ensaio - Ensaio 6 - 27/11/2007

Laura não chega, Júlio não chega. O que vai ser desse ensaio? Tô com medo. E ainda tem que pensar na sala! Não quero viver a vida de ensaios fragmentados por falta de sala.

Sala disponível. Boa sala. Parece que está tudo bem. Nina vai dirigir. Não, Laura chegou. Acho que Nina não quer dar prosseguimento ao seu aquecimento do ensaio passado, pelo menos não fala nada nesse sentido.

Pessoal do Raphael faz uma barulhada!

Um começo falso pra esquentar.

Acho que a Laura fica mais tensa que eu quando toca a ocarina. Ela fica com ar de espera. E interessante como ela tá doida pra falar e não fala. De vez em quando ela faz comentários com a cabeça, como se fosse um sim, não sei.

Nina trouxe uma outra tradução. Sugestão da gente variar as traduções. Talvez assim a gente se livre do texto que tá impregnado na nossa pele.

Júlio precisa de qualquer coisa pra render. Sugestão dele fazer andando. Não serve. Ele faz parado, olha pras mãos, serve mais.

Eu acabo jogando o meu texto fora por ansiedade boba que ainda tem em mim. Tenho que me controlar pra não usar intenções banais, que só enfraquecem o texto.

Sinto que a Nina tá se coçando pra entrar, realmente desestrutura entrar no meio. Vou falar pra ela começar o próximo ensaio. Talvez ajude. Com pouca sala fomos parar no pátio interno.

Choveu e o ensaio acabou. Júlio e eu estamos com fome de fazer. Isso até que tá divertido, pena que acaba semana que vem.

Impressões de Ensaio - Último Ensaio - 28/11/2007

Porque ninguém chega na hora?

Hoje temos uma sala nossa pra ensaiar.

Nina nos aqueceu. Aquecimento mais divertido: “Parabéns pra você, nessa data querida...”

Vejo coisa nova. Nina e Laura estão trabalhando em conjunto. Uma complementa a outra, a situação parece estar bem harmônica.

A primeira passagem foi bem tranquila, seguimos até bem à frente, sem qualquer interrupção. A cena vai ficar até onde ensaiamos hoje. Se na terça o clima permitir iremos até a próxima página.

Pegar nos punhais, sair de cena, mastigando cada palavra que acabei de dizer foi terrível. Estou sentindo qualquer coisa que eu não sei explicar. Um novo início. Não sei o que está me guiando, mas não me sinto como antes. “Se no seu sono não lembrasse tanto..” e lembra mesmo. Não é nenhum pouco tola a idéia de tristeza. Estou com medo do que pode vir. A cena acabou. Conversamos sobre o que aconteceu. Nina disse que ficou com medo. Eu fiquei com medo, ainda estou. Não consigo falar. “vocês querem fazer de novo?” “Vamo lá que o diabo tá aqui.”

Recomeço. Não consigo me controlar, não sei o que está acontecendo. Estou com medo disso atrapalhar. Na verdade, ajuda.

Júlio pára. Está em busca de qualquer coisa que cole a garganta dele. Laura não sabe como ajudá-lo. Nem eu. Nem Nina.

Depois de ficar com as pernas tremendo, as mãos geladas o estado se dissolveu. Vamos nos preocupar com as buscas de Júlio.

Proponho um novo recomeço pra sentir de novo o estado. Não sinto. Tenho medo de nunca mais repeti-lo e ficar obsessivamente atrás dele. Fim do último ensaio.


Anexo II – Email Cia dos Atores

De: doriamagalha@gmail.com

Para: ciadosatores@terra.com.br

Assunto: Gestão de grupos

Corpo do email:

“Olá,
Sou estudante de Direção Teatral da UFRJ e estou fazendo uma pesquisa que serve ao trabalho final da matéria de Ética no Teatro, ministrada pela professora Adriana Schneider.
O tema desse trabalho é a autogestão de grupos e companhias e sua ligação com a produção de pensamento sobre o "fazer" artístico.
Por conhecer o trabalho do grupo e sua reflexão sobre si, utilizo a Cia dos Atores como um dos meus objetos de análise.
Tenho uma questão e ficaria feliz se pudessem me ajudar:
A gestão do grupo está diretamente ligada ao patrocinador, ou a venda dos produtos como o livro "Na Companhia dos Atores" também é geradora de renda?
Sei da indiscrição da pergunta e talvez da mal colocada abordagem. Espero qualquer resposta já muito satisfeita.
Muito obrigada,
Amanda Doria”

Resposta:

“Cara Amanda
A gestão do grupo depende do Patrocinador, no caso deste ano, a
Petrobras. A venda de livros gera uma renda muito pequena revertida
para gastos na nossa sede.
Espero ter respondido sua pergunta. Qualquer dúvida, não hesite em nos procurar.
abs
Bel Garcia
Cia. dos Atores”

Resposta:

“Bel Garcia,

Obrigado por ter respondido a minha pergunta!

Com sua resposta outras dúvidas me surgiram:

Se a renda dos livros não serve a gestão do grupo, gostaria de saber qual o retorno que o livro trás num sentido menos imediatista? O que ao trabalho do grupo foi acrescentado com a presença do livro, tanto no sentido de abrir portas de patrocinadores quanto no sentido de auto-avaliação das pesquisas já desenvolvidas e as posteriores à produção do livro?

Fico muito satisfeita com a colaboração, espero não estar incomodando.

Desde já agradeço.

Amanda Doria “
Anexo III - Relato Andreza Bittencourt – 24/06/2008

O trabalho construído pelo Grupo Alice 118 ao longo de 10 anos foi dedicado há desenvolver uma pesquisa de linguagem própria a partir da trajetória da diretora Ana Kfouri aliada a experiência de cada ator.

Nos dois primeiros espetáculos os atores e a diretora se dedicaram a encenar autores brasileiros, como Nelson Rodrigues, em Eu Sou Mais Nelson e Hilda Hilst, em H H (informe-se). Em ambos os espetáculos os atores e a diretora estudaram a obra a vida dos autores e a partir desse estudo o roteiro foi construído.

Em Eu Sou Mais Nelson cada ator escolheu um personagem que mais se identificava e recortou diálogos ou construiu monólogos dos textos do autor. Dessa forma, Eu Sou Mais Nelson foi construído com trechos de cenas de várias peças (Álbum de Família, A Mulher Sem Pecado, Os Sete Gatinhos, Dorotéia, Toda Nudez Será Castigada, Beijo no Asfalto e A Falecida ), interligadas por frases de Nelson. Ao longo do processo os atores criavam suas cenas e apresentavam para a diretora. A partir daí, a direção criava a unidade necessária para a concepção do espetáculo.

Em H H (informe-se) o roteiro foi criado a partir de fichamentos que os atores faziam dos textos de Hilda Hilst. Cada ator selecionava trechos que mais se identificavam e a diretora criou o roteiro a partir desses textos que também haviam sido selecionados por ela. Depois do roteiro pronto é que o grupo foi para a sala de ensaio. Em H H (informe-se) o grupo teve o privilégio da própria escritora intervir no roteiro. Um dos momentos mais fortes do espetáculo era de um texto que Hilda Hilst sugeriu.

Festim, terceiro espetáculo do grupo, surgiu da vontade dos atores vivenciarem personagens. Ana Kfouri propôs, então, que cada ator escolhesse um personagem ou personalidade da história mundial. Dessa forma, cada ator escolheu e pesquisou textos, biografias, assistiram a vários filmes e o roteiro foi elaborado a partir de diversos textos, sendo utilizado trechos de vários autores, escritores e poetas, como Adélia Prado, Luis Fernando Verissimo, Rubem Fonseca, Drummond, Mário Quintana, Gregório de Matos, Shakespeare, James Joyce, Nietzsche, entre outros, intensificando cada vez mais a fragmentação de textos já desenvolvida pelo grupo. Nesse período os atores se dedicaram ao longo de 6 meses somente para a criação do roteiro. A idéia criada por Ana kfouri era a de que esses personagens se encontrariam numa grande festa na casa de Narciso (personagem escolhido por um dos atores).

Depois de intensificarem essa pesquisa textual Ana Kfouri propõe ao grupo criar seu quarto espetáculo: Comoção. Mergulhando na investigação corporal encenando um espetáculo onde a idéia foi desenvolvida através da tessitura dos corpos, criando uma aventura através dos estados emocionais do homem e suas conseqüentes ações e reações frente às vicissitudes da vida. Se inicia, nesse momento, uma investigação espacial, ao trabalharem pela primeira vez em uma arena e a relação ator-expectador. Em Comoção o grupo pesquisou por 1 ano e meio. Uma pesquisa de muita técnica e experimentação sensorial. Todos os atores passavam por todos os momentos da vida, desde bebês a idosos passando pela infância, adolescência e maturidade. A pesquisa proposta por Ana Kfouri era a de que os atores vivenciassem estados corporais. Não poderiam ser caricatos. Como exemplo, para que os atores descobrissem os bebês a pesquisa foi toda em cima do estado primitivo, os adolescentes pelo corpo desengonçado, o idoso pela exaustão de movimentos, o peso do corpo e o olhar constantemente recontando imagens da memória. Em relação a proximidade com a platéia, Comoção proporcionou aos atores o início dessa pesquisa que mais tarde é intensificada em Potlatch. Em dois momentos os atores entram em contato direto com a platéia, no primeiro fazem uma brincadeira de mímica onde o público tem que descobrir o que o ator está querendo dizer e o segundo distribuindo bombons e saboreando junto com a platéia.

Com Potlatch, uma homenagem à escritora Hilda Hilst, o grupo intensifica essa pesquisa aproximando ainda mais os pólos ator-espectador e explorando a relação espacial promovendo um espaço de convivência artística, compreendendo na própria apresentação, debates e jogos interativos, de maneira convidativa e informal. Em Potlatch, o grupo extrapola essa pesquisa. O espetáculo começa do lado de fora do teatro. São as rodas das Loris e dos Crassos. Cada ator reúne sua roda e narra um trecho do Caderno Rosa de Lori Lambi (as atrizes) e Contos de Escárnio (os atores). Depois o público é convidado a entrar no teatro e se divide em três rodas. Em cada roda três atores. Esse momento foi muito curioso em nossos ensaios porque nós conversávamos com a platéia sobre a vida de Hilda Hilst. Nos ensaios foi a etapa mais difícil pois tínhamos que conquistar uma naturalidade muito grande num texto que era decorado. Essa proximidade com o público foi um exercício de muitas descobertas pois era preciso fazer um esforço para não fazer esforço. Uma suposta tranqüilidade, um grande fingimento que você não está em foco, que você não está dominando aquele jogo, mas no fundo é você quem faz todo aquele clima se instaurar, é uma contradição, você sai do lugar central, mas continua nele e com mais força ainda.


Anexo IV - Relatório I revisado (18/06/2008)

Objetivo:

Articular a idéia de gestão de grupos com a idéia de pensamento sobre o teatro produzido, seja de dentro do processo (atores), seja de fora (mídia especializada).

Objeto estudado:

Grupo Alice 118

Estratégias:

-Leitura de material cedido pelo grupo:

Clipping, impressões de ensaio

-Entrevistas (presenciais ou não)

Bibliografia:

http://www.anakfouri.com/

http://www.grupogalpao.com.br/novosite/port/home/index.php

http://www.ciadosatores.com.br/home_fr.html


Anexo V – Preços das publicações

Galpão

Livro Diários de Montagem

Relato sobre os processos de montagem de Romeu e Julieta, Partido, Um Moliere imaginário e

Rua da Amargura.

Venda pelo site do grupo: R$ 35,00.

Livro O Palco e a Rua

Livro das pesquisadoras Júnia Alves e Márcia Noé sobre a trajetória do Grupo Galpão, a partir da análise dos espetáculos.

Venda pelo site do grupo: R$ 35,00.

Textos das montagens

Coleção de textos de 10 montagens marcantes da trajetória do Grupo.

Venda pelo site: R$15,00 (cada)

Cia dos Atores

Livro Na Companhia dos Atores - Ensaios Sobre os 18 Anos da Cia dos Atores

De Enrique Diaz.

Editora: Senac Rj

Venda Saraiva: R$ 68,00

(Encontra-se de R$ 78,90 à R$ 53,72, na internet.)

Armazém

ESPIRAIS- Armazém Companhia de Teatro [ 1987 - 2007 ]

Organização: Marcos Losnak + Maurício Arruda Mendonça + Paulo de Moraes

Venda pela livraria da Travessa: R$ 65,00.

Para ver com olhos livres

Livro de imagens.

Venda pelo site do grupo: R$30,OO.


Anexo VI – Trecho dos Diários de Montagem do Galpão

“Belo Horizonte, 17 de agosto de 1992

(...)Diante do povaréu desconhecido, começamos o ensaio depois de quarenta minutos de aquecimento sob a direção do assistente, devido a viagem do diretor. Enfraqueço quando Gabriel ou Arildo se ausentam e creio que também os atores perdem um pouco de seu afã.

Após apitar duas vezes, Shakespeare recita os versos do prólogo. Eduardo, um pouco sem concentração, erra os baixo da sanfona. Muito preso à marcação complexa, exaurido pelas repetições que requerem rigor e precisão, o ensaio segue desalmado. Mas isso faz parte, espero, de processo, como decorar tabuada, ao final do qual a alma, a fluidez e a liberdade nos esperam. Mercúcio erra na entrada de sua fala. Desanimado, olho o mar preto e concentrado do café. A xícara que prefiro é a que :em asa cheia. Tem uma pequenina, mais charmosa, e que os outros prefere mais. Subindo os olhos, noto que as botinas dos atores estão bonitas mas ainda dificultam os saltos. No chão repousa uma das bonecas feitas pelo Agnaldo, precisando ser melhor trabalhadas pelo ator. Ao lado das latinha enferrujadas do cenário, o guarda-chuva lançado sem magia por Romeu aterriza com estardalhaço. A mão de Arildo passa recolhendo as flores derrubadas. No chão, também cai a máscara de Mercúcio e repercutem os erros de textos. As pernas de uma calça azul e triste como eu passam diante de minha melancolia vestida pela Babaya. Ela faz observações que Arildo anota em seu caderno. Nas coxias, a manipulação do pandeiro pelo Chico desconcentra e perturba todos nós. Junto com Mercúcio, ele sai procurando algo de somenos nas gavetas dos bastidores. Influenciado pelo piso astrológico desta peça, adquiri um livro de cartas celestes que me faz companhia na solidão de hoje. A representação mecânica faz o ensaio transcorrer rapidamente, como quando os atores amarram as pernas de pau, e faz o trágico perder para o cômico. Aos poucos, o mecânico cederá lugar à alma. Alguns risos da platéia estimulam o encontro com uma vitaliidade ausente. Isso ajuda a um processo em curso: fazer os atores sentirem-se mais autores do espetáculo. Ao fundo, Teuda tropeça. Será que o carro está quente para mostrar as entranhas saturninas do sepulcro de Julieta? Teuda entra e sai da "Esmeralda" mais facilmente, "tamanha é a leveza da coisas vãs, senhor". Como o canto de Julieta, os pés do Narrador vão sem energia para realizar o casamento. O desafino é amplo, geral e irrestrito e clama pela anistia de Babaya. Hoje, Teobaldo porta barbicha e bigode. O Galopae, galopae ..., um dos meus indicadores favoritos da tonalidade geral dos ensaios, soa fraco e dito no agudo, sem a gravidade da mulher e só com cinqüenta por cento da nossa Julieta. "É assim mesmo", me diz Arildo. Discordo e acho que não é e nem deve ser como creio se comprovar por ela não nos arrebatar e deixar o espaço aberto para a expansão do cômico catalisar a platéia através da Ama. Quando Julieta tenta engrossar a voz ("esta palavra, desterrado" - soa falso e regride ao agudo ruim e chapado nas falas de menina aos meus ouvidos. Não virou mulher, hoje, e permanece fraca ao se retirar para o quarto, como se poupasse a voz. O assistente ajuda ao protagonista colocar as pernas de pau enquanto Julieta erra suas falas. Triste e irritadiço, estou muito crítico. Graça ao Frei atento, aparecem a mala e o guarda-chuva de Romeu na última hora. Desencanto: substantivo e verbo. Sem dúvida. O elenco está cansado da maratona. Mas é preciso sempre esvaziar para recomeçar e reapresentar tudo sempre como se fosse a primeira vez. permanentemente inaugural. O canto de Shakespeare treme e a fala da Sra. Capuleto engasga. "Inês-peradamente" Julieta erra de novo em ponto crucial e é obrigada a bisar sua resposta à mãe. Erra de novo na fala do veneno, mal acompanhada pelo flautista. Deve estar louca para acabar com o ensaio. O cômico manteve-se e a Ama se destaca, o trágico foi lá para Morro Vermelho e não veio, hoje. É preciso responder à Estefânio. O arrastado do ensaio dá-me ganas de ir embora. O Frei está bem, contudo. Com muito custo, a Veraneio é ligada e o assistente corre para afastar as latas enferrujadas do chão, dando-lhe passagem. Ri-se na morte de Julieta. Na entrada de Romeu no mausoléu, a platéia desconfia o trágico na bela fala do protagonista. O silêncio é tão profundo que ouve-se o barulho de minha caneta correndo sobre o papel. Atentíssima, Babaya ouve o flautista errar e errar de novo. Ao final, Julieta parece recobrar as energias, mas sua mão não consegue segurar a espada de São Jorge do seu punhal, e ele cai junto com a convicção de sua morte. O canto final é débil. Nada me entusiasmou hoje, a começar por mim. Será que errei? Fui crítico demais? ‘Arildo, se eu fosse você dava um esporro, como Gabriel.’ “
Bibliografia:

BRANDÃO, Carlos Antônio Leite. Diário de Montagem: Romeu e Julieta. Belo

Horizonte: Editora UFMG, 2003.

Sites pesquisados:

http://www.anakfouri.com/

http://www.grupogalpao.com.br/novosite/port/home/index.php

http://www.ciadosatores.com.br/home_fr.html

http://www.armazemciadeteatro.com.br/



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