cogito, ergo sum
O Existencialismo - Sartre por Helaine Nascimento
Enquanto filosofia da crise e por suas próprias origens Kierkegaardianas, deve ser historicamente entendido como um complexo de doutrinas eminentemente antirracionalistas.Com efeito, desprezando o discurso especulativo da metafísica e o raciocínio frio das ciências positivas, o existencialismo vai buscar na "intuição" de Bergson e na fenomenologia de Husserl o método ou caminho que nos conduz "de retorno as coisas", à existência individual concreto, como algo primordial, misterioso, irredutível e anterior à essência. Existência como símbolo de oficina e de arena onde o homem forja o seu projeto e trava a batalha cotidiana do seu próprio destino.
Conceitos:
A espécie humana tem livre arbítrio;
A vida é uma série de escolhas, criando stress;
Poucas decisões não têm nenhuma conseqüência negativa;
Algumas coisas são absurdas ou irracionais, sem explicação;
Se você toma uma decisão, deve levá-la até o fim
O EXISTENCIALISMO É UM HUMANISMO
No ensaio "O Existencialismo é um Humanismo", de 1946, o filósofo francês Jean Paul Sartre (1905 - 1980) oferece uma resposta como esclarecimento sobre o existencialismo, cuja compreensão estava sendo vulgarizada e interpretada de acordo com a ideologia do público leitor.
Sartre opõe-se às críticas que lhe fazem cristãos e marxistas, ao acusarem-no de: isolar o homem trancando-o numa subjetividade egoísta e burguesa,incitar o homem ao quietismo num mundo absurdo totalmente desprovido de sentido,acentuar o lado sórdido da existência humana ,liberar o homem de quaisquer condicionamentos morais,pela eliminação de Deus que é fonte de todas os valores.
Sartre procura responder a essas críticas explicando, primeiramente, em que usa o termo humanismo no sentido de que toda a ação passa pela subjetividade, assim toda a ação é humana, seja repugnante ou não. Ao nos depararmos com algo injusto, segundo a concepção existencialista, pensaremos “isto é humano”. Mas isto não significa uma concepção pessimista, ao contrário, é uma visão otimista: se é humano, posso ou não praticar este ato - não há nada além de mim mesmo que me compele a isto.
Neste momento, Sartre cita as duas escolas existencialistas, a católica e a atéia. Ambas têm em comum apenas a adoção do pressuposto de que a existência precede a essência. Para explicar tal significado, Sartre inicialmente apresenta a idéia oposta, comparando o ser humano com um objeto fabricado. Para qualquer objeto temos um modelo, que definirá como será o produto. Neste caso a essência (modelo) precede a existência (produto). Os filósofos do século XVII, que concebem um Deus criador, vêem o homem como produto da obra divina, assim como qualquer produto fabricado. A essência de todos os homens é única, pois foi concebida por Deus. Mesmo os filósofos ateus, como o filósofo prussiano Emmanuel Kant, adotam a idéia de que a essência precede a existência, ao pressuporem uma natureza humana universal. O existencialismo ateu, afirma Sartre, ao não admitir a existência de Deus, permite que a existência humana precede a essência. O homem existe no mundo, surge no mundo, para depois se definir. E mais: só depois que existiu o homem pode dizer o que é a humanidade, podendo julgar-se alguma coisa apenas a partir daquilo que já está feito. Em suma: o homem é aquilo que faz.
Neste momento Sartre afirma: “o homem antes de mais nada, é um projeto que se vive subjetivamente”. Ao conceber o homem como projeto, tornamo-nos responsáveis por aquilo que somos. Não somos aquilo que queremos ser, mas somos o projeto que estamos vivendo e este projeto é uma escolha, cuja responsabilidade é apenas do próprio homem.
No entanto, ao dizer que o homem é responsável por si mesmo, o existencialismo transcende a idéia do subjetivismo individualista que os críticos querem imputar-lhe. O homem, no ato de fazer uma escolha, não escolhe somente a si mesmo, mas escolhe toda humanidade. Ou seja: ao escolher o homem que deseja ser, o homem está julgando como todos os homens deve ser. Em outras palavras: o homem está condenado à subjetividade humana. Somos responsáveis por toda humanidade.
Dito isto, Sartre apresenta a idéia existencialista de angústia. O homem, ao perceber que sua escolha envolve não apenas a si mesmo, mas toda humanidade e que a responsabilidade dessa escolha é inteiramente sua, se sentirá angustiado. Só o homem de má fé consegue disfarçar a angústia, dissimulando a sua responsabilidade por si e por toda humanidade. Os próprios atos de dissimular e mentir implicam em uma escolha. Ao atribuir a responsabilidade a outrem, estamos escolhendo a mentira não só para a própria existência, como para a de todos os homens. O homem que nega a angústia tem na angústia a sua própria forma de existir.
”A maldade humana e a fraternidade são opostos que nos ligam à responsabilidade de nossas escolhas: angústia como a consciência do que somos”.
Ainda sobre a angústia, Sartre destaca que o homem, quando responsável e perante qualquer decisão, sente-se angustiado. Mas tal angústia não o impede de agir, pelo contrário, implica na ação. O homem, responsável pela humanidade, sentirá angústia ao escolher, pois esta escolha implica no abandono de todas as outras possibilidades. Porém, a idéia de que a existência precede a essência permite outros desdobramentos. O homem não pode responsabilizar a sua existência à natureza alguma. Não há nada que legitime seu comportamento, não há nada que o determine. O homem faz-se a si próprio, é livre: tem total liberdade para escolher o que se torna, é responsável por sua paixão. Assim, não há nada que justifique seus atos. O homem está desamparado, condenado à sua própria escolha.
Sendo o homem livre para suas escolhas, qual o lugar da moral na doutrina existencialista? Sartre, exemplificando, diz que há dois tipos de moral. A moral cristã prega que devemos seguir o caminho mais duro. Mas Sartre questiona-se: “qual o caminho mais duro?”. Já a moral para Kant afirma que devemos tratar as pessoas como fim, e não como meio. Porém, ao escolher algo como fim, as outras opções serão tratadas como meio. Então, seria o sentimento que determina nossa escolha pela moral a ser seguida? Sartre refuta essa idéia. Só podemos dizer que fizemos algo por amor, depois que já tivermos realizado. Justificar uma ação pelo sentimento terá seu valor apenas depois que o ato se concretizar: o sentimento se constituiu pelos atos praticados. Portanto, não podemos consultar nossos sentimentos como guia de nossas ações e não há também nenhuma moral que me guie: o homem é livre para escolher e tem a constante possibilidade de se inventar.
Neste ponto, Sartre retoma as críticas iniciais e às rebate a partir da argumentação descrita acima. Explica como é visto pela doutrina existencialista a proposição fundamental cartesiana: cogito, ergo sum (penso, logo existo). Para o existencialismo, significa que não só atingimos a nós próprios, atingimos a nós através do outro. O outro é a condição para nossa existência, não somos nada sem o reconhecimento do outro. Para o homem conhecer-se é necessário, primeiramente, que o outro o reconheça. Este é o mundo intersubjetivo, de âmbito da consciência, e é através dele que julgamos a nós mesmos e os outros. A partir desse mundo intersubjetivo, Sartre afirma que mesmo não havendo essência, para toda existência humana há uma condição: a priori, há um conjunto de limites que esboçam a situação do homem no universo.
Descartes e sua máxima: cogito, ergo sum.
Há ainda uma universalidade de todo projeto individual. Podemos compreender a existência de qualquer homem, mas isso não significa que possamos definí-lo estaticamente. A universalidade é construída dinamicamente. O homem a constrói no ato de escolher, o que implica que, ao escolher, ele estará compreendendo o projeto de qualquer homem, pois o homem não é capaz de ultrapassar a própria subjetividade humana.
Sartre retoma o tema da moral e rebate as críticas que acusam o existencialismo de pregar uma escolha gratuita. Volta a dizer que uma escolha implica um compromisso com toda a humanidade, já que toda escolha é um compromisso. E, ao escolher um projeto, estamos necessariamente optando por uma moral. Não há como fugir da escolha e, portanto, não há como fugir da moral. A moral só poderá ser julgada no momento em que ela estiver se realizando. Em seguida, Sartre volta a discorrer sobre a liberdade e sua relação com a intersubjetividade. Se por um lado, a sua liberdade não depende de outrem, por outro existe um compromisso: se quero a minha liberdade, sou obrigado a querer a liberdade dos outros. Se alguém nega essa liberdade, escondendo-se em determinismos, este pode ser julgado como covarde. Mas isso apenas se considerarmos a liberdade como único fim moral. A moral universal que podemos conceber é a moral cuja ação se dá em nome da liberdade e não a moral formalmente constituída.
Por fim, Sartre justifica porque seu existencialismo é um humanismo. Humanista por ser o homem o único responsável por suas ações. E existencialista porque, na medida que o homem projeta-se para fora de si mesmo, ele se faz no mundo. Para o homem é sempre possível transcender e superar a si mesmo, na medida que o homem é aquilo que faz de si mesmo, tendo a permanente liberdade de se reinventar.
Enquanto filosofia da crise e por suas próprias origens Kierkegaardianas, deve ser historicamente entendido como um complexo de doutrinas eminentemente antirracionalistas.Com efeito, desprezando o discurso especulativo da metafísica e o raciocínio frio das ciências positivas, o existencialismo vai buscar na "intuição" de Bergson e na fenomenologia de Husserl o método ou caminho que nos conduz "de retorno as coisas", à existência individual concreto, como algo primordial, misterioso, irredutível e anterior à essência. Existência como símbolo de oficina e de arena onde o homem forja o seu projeto e trava a batalha cotidiana do seu próprio destino.
Conceitos:
A espécie humana tem livre arbítrio;
A vida é uma série de escolhas, criando stress;
Poucas decisões não têm nenhuma conseqüência negativa;
Algumas coisas são absurdas ou irracionais, sem explicação;
Se você toma uma decisão, deve levá-la até o fim
O EXISTENCIALISMO É UM HUMANISMO
No ensaio "O Existencialismo é um Humanismo", de 1946, o filósofo francês Jean Paul Sartre (1905 - 1980) oferece uma resposta como esclarecimento sobre o existencialismo, cuja compreensão estava sendo vulgarizada e interpretada de acordo com a ideologia do público leitor.
Sartre opõe-se às críticas que lhe fazem cristãos e marxistas, ao acusarem-no de: isolar o homem trancando-o numa subjetividade egoísta e burguesa,incitar o homem ao quietismo num mundo absurdo totalmente desprovido de sentido,acentuar o lado sórdido da existência humana ,liberar o homem de quaisquer condicionamentos morais,pela eliminação de Deus que é fonte de todas os valores.
Sartre procura responder a essas críticas explicando, primeiramente, em que usa o termo humanismo no sentido de que toda a ação passa pela subjetividade, assim toda a ação é humana, seja repugnante ou não. Ao nos depararmos com algo injusto, segundo a concepção existencialista, pensaremos “isto é humano”. Mas isto não significa uma concepção pessimista, ao contrário, é uma visão otimista: se é humano, posso ou não praticar este ato - não há nada além de mim mesmo que me compele a isto.
Neste momento, Sartre cita as duas escolas existencialistas, a católica e a atéia. Ambas têm em comum apenas a adoção do pressuposto de que a existência precede a essência. Para explicar tal significado, Sartre inicialmente apresenta a idéia oposta, comparando o ser humano com um objeto fabricado. Para qualquer objeto temos um modelo, que definirá como será o produto. Neste caso a essência (modelo) precede a existência (produto). Os filósofos do século XVII, que concebem um Deus criador, vêem o homem como produto da obra divina, assim como qualquer produto fabricado. A essência de todos os homens é única, pois foi concebida por Deus. Mesmo os filósofos ateus, como o filósofo prussiano Emmanuel Kant, adotam a idéia de que a essência precede a existência, ao pressuporem uma natureza humana universal. O existencialismo ateu, afirma Sartre, ao não admitir a existência de Deus, permite que a existência humana precede a essência. O homem existe no mundo, surge no mundo, para depois se definir. E mais: só depois que existiu o homem pode dizer o que é a humanidade, podendo julgar-se alguma coisa apenas a partir daquilo que já está feito. Em suma: o homem é aquilo que faz.
Neste momento Sartre afirma: “o homem antes de mais nada, é um projeto que se vive subjetivamente”. Ao conceber o homem como projeto, tornamo-nos responsáveis por aquilo que somos. Não somos aquilo que queremos ser, mas somos o projeto que estamos vivendo e este projeto é uma escolha, cuja responsabilidade é apenas do próprio homem.
No entanto, ao dizer que o homem é responsável por si mesmo, o existencialismo transcende a idéia do subjetivismo individualista que os críticos querem imputar-lhe. O homem, no ato de fazer uma escolha, não escolhe somente a si mesmo, mas escolhe toda humanidade. Ou seja: ao escolher o homem que deseja ser, o homem está julgando como todos os homens deve ser. Em outras palavras: o homem está condenado à subjetividade humana. Somos responsáveis por toda humanidade.
Dito isto, Sartre apresenta a idéia existencialista de angústia. O homem, ao perceber que sua escolha envolve não apenas a si mesmo, mas toda humanidade e que a responsabilidade dessa escolha é inteiramente sua, se sentirá angustiado. Só o homem de má fé consegue disfarçar a angústia, dissimulando a sua responsabilidade por si e por toda humanidade. Os próprios atos de dissimular e mentir implicam em uma escolha. Ao atribuir a responsabilidade a outrem, estamos escolhendo a mentira não só para a própria existência, como para a de todos os homens. O homem que nega a angústia tem na angústia a sua própria forma de existir.
”A maldade humana e a fraternidade são opostos que nos ligam à responsabilidade de nossas escolhas: angústia como a consciência do que somos”.
Ainda sobre a angústia, Sartre destaca que o homem, quando responsável e perante qualquer decisão, sente-se angustiado. Mas tal angústia não o impede de agir, pelo contrário, implica na ação. O homem, responsável pela humanidade, sentirá angústia ao escolher, pois esta escolha implica no abandono de todas as outras possibilidades. Porém, a idéia de que a existência precede a essência permite outros desdobramentos. O homem não pode responsabilizar a sua existência à natureza alguma. Não há nada que legitime seu comportamento, não há nada que o determine. O homem faz-se a si próprio, é livre: tem total liberdade para escolher o que se torna, é responsável por sua paixão. Assim, não há nada que justifique seus atos. O homem está desamparado, condenado à sua própria escolha.
Sendo o homem livre para suas escolhas, qual o lugar da moral na doutrina existencialista? Sartre, exemplificando, diz que há dois tipos de moral. A moral cristã prega que devemos seguir o caminho mais duro. Mas Sartre questiona-se: “qual o caminho mais duro?”. Já a moral para Kant afirma que devemos tratar as pessoas como fim, e não como meio. Porém, ao escolher algo como fim, as outras opções serão tratadas como meio. Então, seria o sentimento que determina nossa escolha pela moral a ser seguida? Sartre refuta essa idéia. Só podemos dizer que fizemos algo por amor, depois que já tivermos realizado. Justificar uma ação pelo sentimento terá seu valor apenas depois que o ato se concretizar: o sentimento se constituiu pelos atos praticados. Portanto, não podemos consultar nossos sentimentos como guia de nossas ações e não há também nenhuma moral que me guie: o homem é livre para escolher e tem a constante possibilidade de se inventar.
Neste ponto, Sartre retoma as críticas iniciais e às rebate a partir da argumentação descrita acima. Explica como é visto pela doutrina existencialista a proposição fundamental cartesiana: cogito, ergo sum (penso, logo existo). Para o existencialismo, significa que não só atingimos a nós próprios, atingimos a nós através do outro. O outro é a condição para nossa existência, não somos nada sem o reconhecimento do outro. Para o homem conhecer-se é necessário, primeiramente, que o outro o reconheça. Este é o mundo intersubjetivo, de âmbito da consciência, e é através dele que julgamos a nós mesmos e os outros. A partir desse mundo intersubjetivo, Sartre afirma que mesmo não havendo essência, para toda existência humana há uma condição: a priori, há um conjunto de limites que esboçam a situação do homem no universo.
Descartes e sua máxima: cogito, ergo sum.
Há ainda uma universalidade de todo projeto individual. Podemos compreender a existência de qualquer homem, mas isso não significa que possamos definí-lo estaticamente. A universalidade é construída dinamicamente. O homem a constrói no ato de escolher, o que implica que, ao escolher, ele estará compreendendo o projeto de qualquer homem, pois o homem não é capaz de ultrapassar a própria subjetividade humana.
Sartre retoma o tema da moral e rebate as críticas que acusam o existencialismo de pregar uma escolha gratuita. Volta a dizer que uma escolha implica um compromisso com toda a humanidade, já que toda escolha é um compromisso. E, ao escolher um projeto, estamos necessariamente optando por uma moral. Não há como fugir da escolha e, portanto, não há como fugir da moral. A moral só poderá ser julgada no momento em que ela estiver se realizando. Em seguida, Sartre volta a discorrer sobre a liberdade e sua relação com a intersubjetividade. Se por um lado, a sua liberdade não depende de outrem, por outro existe um compromisso: se quero a minha liberdade, sou obrigado a querer a liberdade dos outros. Se alguém nega essa liberdade, escondendo-se em determinismos, este pode ser julgado como covarde. Mas isso apenas se considerarmos a liberdade como único fim moral. A moral universal que podemos conceber é a moral cuja ação se dá em nome da liberdade e não a moral formalmente constituída.
Por fim, Sartre justifica porque seu existencialismo é um humanismo. Humanista por ser o homem o único responsável por suas ações. E existencialista porque, na medida que o homem projeta-se para fora de si mesmo, ele se faz no mundo. Para o homem é sempre possível transcender e superar a si mesmo, na medida que o homem é aquilo que faz de si mesmo, tendo a permanente liberdade de se reinventar.
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